Causas do suicídio: entenda quais são e como trabalhar a prevenção com seus pacientes

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Os motivos que levam uma pessoa ao suicídio podem envolver desde aspectos sociais e econômicos até os psicológicos e psicopatológicos. Contudo, em sua maioria, apresentam como base diferentes transtornos mentais, sendo a depressão o mais comum.

Dados publicados no Boletim Epidemiológico da Vigilância Sanitária apontam que entre 2010 e 2019, ocorreram 112.230 suicídios no Brasil, com um aumento de 43% no número anual de mortes, de 9.454 em 2010, para 13.523 em 2019. As causas do suicídio são multifatoriais.

Neste artigo, vamos abordar alguns dos principais fatores que podem levar uma pessoa ao suicídio e como os médicos podem auxiliar a preveni-lo de maneira individual e coletiva. Boa leitura!

Quais são os principais fatores que podem influenciar o suicídio?

Transtornos mentais como depressão, bipolaridade, bordeline e contextos da vida, são alguns dos principais fatores relacionados ao suicídio.

Eles podem se manifestar de diferentes formas, sendo importante conhecer suas características para identificá-los e adotar medidas de prevenção e manutenção da saúde mental.

A seguir, detalhamos alguns dos principais transtornos mentais.

Depressão

A depressão é um transtorno mental que afeta pessoas de diferentes idades, gênero e classes sociais, causando prejuízos para a vida pessoal, profissional e acadêmica do paciente. Tem como principais características a tristeza persistente e a perda de interesse em atividades, antes consideradas prazerosas. Tais sinais são acompanhados da falta de realização de atividades diárias, por, pelo menos, duas semanas.

Além disso, pessoas com depressão podem apresentar alguns dos seguintes sintomas, concomitantemente:

  • angústia;
  • apatia;
  • aumento ou redução do sono;
  • baixa autoestima;
  • cansaço;
  • falta de energia;
  • indecisão;
  • inquietude;
  • irritabilidade;
  • mau-humor;
  • medo do futuro;
  • mudanças no apetite;
  • pensamentos suicidas ou de causar danos a si mesmas.
  • perda de concentração;
  • sentimento de culpa ou desesperança.

A depressão não é um sinal de fraqueza, sendo considerada uma doença tratável por meio de acompanhamento médico psiquiátrico e psicoterapia. Embora ela possa ocorrer em diferentes níveis, todos exigem uma atenção especializada, já que essa é uma condição que pode desenvolver outros transtornos psiquiátricos relacionados.

Transtorno bipolar

O transtorno bipolar também é um dos transtornos mentais com alta incidência no Brasil e no mundo. Nesse sentido, segundo o Ministério da Saúde, dados da OMS indicam que a doença atinge cerca de 140 milhões de pessoas em todo o planeta.

A condição é caracterizada por oscilações no humor, com alternâncias que variam conforme o grau e o tipo da doença. Dessa forma, a pessoa pode se apresentar eufórica por um períodoe, em seguida, ser tomada por uma fase depressiva.

Esse comportamento bipolar pode estar relacionado a outros transtornos psicológicos que agravam o quadro, como a ansiedade. Contudo, alguns pacientes com esse distúrbio podem apresentar apenas os episódios de mania, com alta energia, sem as fases depressivas.

Nesse transtorno, os sinais podem oscilar da seguinte maneira:

  • alta energia ou desânimo em pouco espaço de tempo;
  • apatia ou impulsividade;
  • presença de todos os sintomas da depressão;
  • tristeza ou felicidade extrema em períodos bem curtos.

Na fase de mania, o paciente fica bastante eufórico e apresenta as seguintes características:

  • criatividade e disposição mental;
  • diversos pensamentos ao mesmo tempo;
  • excesso de autoestima;
  • irritabilidade e agressividade;
  • realização de atividades intensas, com ‍excesso de energia.

Borderline

O Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) pode ser identificado pela desregulação emocional, sendo, muitas vezes, confundido com a bipolaridade. Contudo, há uma diferença marcante entre esses transtornos: o bipolar tem alternância entre o estado depressivo e o maníaco em que cada um deles dura alguns dias, enquanto o border tem emoções intensas e o humor oscila em curtos espaços de tempo, como algumas horas.

A principal causa desse transtorno de personalidade é biossocial, envolvendo aspectos genéticos e sociais. A predisposição é maior para quem possui pais com TPB, depressão, bipolaridade, entre os demais transtornos. Além desses, pode haver um fator social ligado ao núcleo familiar do paciente, que gera uma predisposição para o distúrbio.

Nesse sentido, pessoas que passaram por traumas, como um abuso sexual, sem considerar outros fatores, podem desenvolver o transtorno.

O Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) relaciona nove sintomas que caracterizam o Borderline. Para o paciente ser diagnosticado com o transtorno, é preciso atender a pelo menos cinco dos seguintes sinais:

  • comportamentos autodestrutivos, com ameaças e/ou gestos repetidos de automutilação e suicídio;
  • grandes esforços para evitar o abandono, que pode ser imaginado ou real;
  • impulsividade em, pelo menos, dois aspectos que podem prejudicá-los, como direção perigosa, compulsão alimentar, sexo inseguro, entre outros;
  • instabilidade em relação à autoimagem;
  • alterações bruscas no humor, com duração de apenas algumas horas e eventualmente mais do que alguns dias;
  • raiva intensa de maneira inadequada ou dificuldades para controlá-la;
  • relacionamentos instáveis e intensos com fases alternadas de idealização e desvalorização do outro;
  • constantes sentimentos de vazio;
  • sintomas dissociativos graves provocados por estresse ou pensamentos paranoicos temporários.

Ansiedade

A ansiedade é também um transtorno muito comum, sendo uma das principais queixas de pessoas que buscam o atendimento psiquiátrico. Os sintomas variam conforme o grau de comprometimento do transtorno por existirem outros distúrbios psíquicos associados à ansiedade. Os mais evidentes são o transtorno de pânico e a fobia.

Quanto à intensidade das manifestações, os pacientes podem apresentar uma ansiedade leve, moderada ou grave. Em seu nível mais elevado, evidencia-se o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), caracterizado por uma ansiedade patológica, que gera sintomas crônicos.

Os sinais se apresentam por um misto de sensações que alteram o estado físico e mental, tais como:

  • angústia;
  • diarreia;
  • dor no peito;
  • dor no pescoço, na nuca e na cabeça;
  • falta de ar;
  • formigamento nas extremidades;
  • mau pressentimento;
  • palpitação;
  • pânico, medo e tensão;
  • sensação de desconforto físico;
  • sudorese;
  • tremores nas extremidades.

Contextos de vida

Os contextos de vida são fatos que podem provocar um grande sofrimento ou apatia, podendo, em casos extremos, levar ao suicídio.

Um estudo da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e parceiros aponta para a importância de considerar os fatores de suicídio específicos por gênero em intervenções de redução de risco e estratégias de prevenção.

Nesse sentido, a publicação “Fatores contextuais associados à mortalidade por suicídio em nível de país nas Américas, 2000 – 2019", apontou que o alcoolismo e uso de outras substâncias estão relacionados ao aumento do suicídio entre homens.

Nas mulheres, a desigualdade educacional se mostrou como principal fator. Já o desemprego esteve associado ao aumento dos casos de suicídio para ambos os sexos.

Dessa forma, o estudo mostra a importância de abordar fatores contextuais que afetam mulheres e homens de maneira diferente, exigindo uma abordagem de toda a sociedade.

Qual a importância da campanha Setembro Amarelo na prevenção do suicídio?

O Setembro Amarelo é uma importante campanha nacional, por ter como foco a prevenção do suicídio. Esse movimento foi criado no Brasil em 2015, com base em um projeto elaborado pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), Conselho Federal de Medicina (CFM) e Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

Essas instituições aproveitaram a data mundial, assim como o amarelo associado ao tema, para identificar o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, comemorado no Brasil, no dia 10 de setembro.

Trata-se de uma ação fundamental para conscientizar sobre a prevenção do suicídio e debater informações essenciais sobre essa, considerada a segunda maior causa mundial de morte entre jovens.

Quais estratégias podem ser adotadas para evitar o suicídio?

Além da ajuda voluntária de cidadãos e órgão envolvidos na campanha, a atuação do médico na identificação precoce do risco de suicídio em pacientes, com posterior assistência adequada, pode fazer a diferença. Mas aqui, nos referimos não somente a psicólogos e psiquiatras.

Os profissionais da rede de atenção primária, como os enfermeiros e os médicos generalistas, muitas vezes, podem ser os primeiros a perceber os sinais de uma pessoa que pensam em suicídio. Na atenção secundária e terciária, como hospitais gerais de urgência e emergência, bem como nos serviços especializados, a ajuda é essencial.

A seguir, acompanhe as estratégias que podem ser adotadas por médicos para evitar o suicídio ou novas tentativas de pacientes que já tentaram tirar a própria vida.

Identifique mudanças de comportamento nos pacientes

Os pacientes com risco de suicídio podem demonstrar alguns sintomas e sinais normalmente depressivos, como:

  • tristeza;
  • perda de interesse por coisas que antes gostava;
  • tendência ao isolamento;
  • choro fácil;
  • angústia constante;
  • alterações no ciclo do sono e no apetite.

Também é importante considerar comentários como: “gostaria de estar morto"; “não vejo razão para continuar vivendo”; “não aguento mais” ou “me sinto um fardo para as pessoas”. Outro aspecto que pode indicar mudanças comportamentais são atitudes que fogem do habitual, como:

  • aumento no consumo de álcool e drogas;
  • ações imprudentes;
  • agressões;
  • busca ativa de formas como acabar com a própria vida, especialmente por meio da internet.

Reserve um tempo e local ideal para abordagens

Conforme o manual do Centro de Valorização Humana (CVV) dirigido aos profissionais da área de saúde mental, o primeiro contato é muito importante, e a melhor maneira de abordar o assunto é considerar os seguintes passos:

  1. Achar um lugar adequado para uma conversa tranquila, com privacidade;
  2. Reservar o tempo necessário. Em geral, os pacientes com ideias suicidas precisam de um tempo maior para deixar de sentir que é um fardo. Aqui, é muito importante o profissional estar disponível emocionalmente para dar atenção;
  3. Ouvir a pessoa de maneira efetiva, a chamada "escuta ativa". O estabelecimento desse contato e a sincera disposição em ouvir pode ser considerado o maior passo para diminuir o desejo de suicídio.

O principal objetivo é dar à pessoa uma nova esperança, de modo a fazer com que ela perceba que, de fato, tudo pode melhorar.

Aborde o assunto de maneira adequada

Uma abordagem adequada e correta pelo profissional que presta o primeiro atendimento ao paciente que tentou suicídio ou se encontre em tratamento para transtorno psiquiátrico grave, é a chave para a prevenção de novas tentativas.

As principais orientações da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP) são no sentido de:

  • demonstrar empatia ao sofrimento da pessoa, evitando julgamento moral e estigmas;
  • diante de sinais de riscos, conversar de maneira aberta e cautelosa sobre suicídio;
  • ter paciência para ouvir o paciente e não falar apressadamente;
  • oferecer ajuda.

A abordagem verbal bem colocada, no momento certo, pode ser tão ou mais importante que um medicamento, por trazer alívio ao paciente e sentimento de acolhimento e valorização.

Outro ponto importante a ser considerado é não desqualificar o paciente que sobreviveu a uma tentativa de suicídio ou que apenas ameaçou cometê-lo. Isso porque todo paciente que fala sobre suicídio apresenta um potencial risco, merecendo atenção especial e investigação do contexto.

Evite ideias sobre suicídio que podem levar ao erro

Ideias equivocadas podem desviar o encaminhamento para um tratamento que poderia salvar vidas. A seguir, conheça algumas que merecem reflexão.

  • “Perguntar sobre suicídio pode induzir o paciente a isso”: o tema do suicídio geralmente não é tratado na mídia para evitar o incentivo, contudo quando o questionamento é realizado de maneira sensata e franca há um estreitamento do vínculo com a pessoa. Ela se sente acolhida por um profissional cuidadoso e interessado pelo seu sofrimento.
  • “O paciente ameaça que vai tirar a própria vida só para manipular”: qualquer tipo de ameaça de suicídio precisa ser levada a sério. É fundamental considerar que quando a pessoa chega ao ponto de pensar suicídio, está sofrendo e precisando de ajuda.
  • “A pessoa deseja se matar não avisa da sua intenção antes”: a maioria das pessoas que tentam ou cometem o suicídio havia comunicado de alguma forma essa intenção aos familiares, conhecidos ou amigos.


Participe e divulgue a campanha Setembro Amarelo!

Há diversos materiais que orientam cidadãos e profissionais da saúde sobre como participar e divulgar a campanha Setembro Amarelo, como a Cartilha Suicídio: informando para prevenir e as Diretrizes para participação e civulgação da Campanha Setembro Amarelo.

Como vimos, as causas do suicídio envolvem diversos fatores e a prevenção é a melhor forma de evitar que as estatísticas continuem crescendo. Para isso, além de campanhas, é preciso haver mais psicólogos e médicos especialistas em Psiquiatria disponíveis na rede pública e particular de saúde, preparados para o atendimento desses casos.

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