Afinal, o uso de cigarro eletrônico faz mal ao paciente?

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A queda do tabagismo foi uma das grandes conquistas da área da saúde nos últimos anos, que mostra a importância da orientação médica no combate ao tabagismo.

Em 2015, havia cerca de 1,32 bilhão de fumantes e a projeção para 2025 é de 1,23 bilhão. Porém, o que dizer sobre o vape nesse cenário? Será que o cigarro eletrônico faz mal?

Bem, de fato, esses dispositivos foram introduzidos no mercado como uma alternativa ao cigarro convencional. Com sabores e aromas mais atrativos, ganhou o gosto da população, sobretudo adolescentes e jovens adultos.

Contudo, cada dia mais, fica-se evidente que os vapes também acometem a saúde das pessoas. Por isso, os profissionais da saúde devem redobrar a atenção para orientar de forma correta e combater esse tipo de hábito.

Entenda o que é o cigarro eletrônico

Com a popularização do uso do cigarro eletrônico, não é raro ver um jovem com um “pen drive” na mão. Na verdade, o dispositivo apresenta um formato bem semelhante ao de uma caneta.

O que muitos não sabem é que o primeiro projeto foi desenvolvido no século passado, em 1963, pelo americano Herbert. A. Gilbert. Na época, não havia tecnologia suficiente para sua comercialização.

Ao longo dos anos, houve mudanças na estruturação do dispositivo e na patente, até chegar naquilo que vemos hoje. Assim como outros cigarros, os vapes também apresentam nicotina. Aqui, ela é consumida na forma de aerossol.

Teoricamente, existe a remoção de impurezas e outras substâncias que compõem a folha de tabaco. Na prática, sabe-se que o controle de produção é muito difícil e não se pode garantir a substância na forma mais pura.

Por fim, os usuários de vapes não se consideram fumantes, mas sim “vapers”. Diante da diversidade de aromas e sabores, vale a pena conhecer um pouco mais sobre a composição.

Saiba quais compostos estão presentes

Antes de partirmos para as substâncias, vamos conhecer as peças do dispositivo. No geral, ele conta com uma lâmpada de LED, bateria, microprocessador e sensor.

O atomizador é a estrutura responsável por aquecer e vaporizar a nicotina, que vai estar contida em um cartucho. Existe, também, a possibilidade de utilizar refis. Portanto, o atomizador vai atingir temperaturas muito elevadas a fim de produzir o vapor.

Uma vez produzido, poderá ser inalado pelos usuários. Vale lembrar que podem existir outras substâncias além de nicotina, como:

  • acroleína;
  • propilenoglicol;
  • glicerina.

Além delas, os aromatizantes são frequentes. Uma dúvida comum é se existe algum malefício nos dispositivos que não contém nicotina. Na verdade, o calor necessário para produzir o vapor resulta em reações químicas que transformam as substâncias acima em sua forma tóxica.

Veja o que diz a legislação

Agora, vamos falar sobre uma questão polêmica: a legislação em torno dos cigarros eletrônicos. Na verdade, desde 2009, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) proíbe a comercialização, importação e até mesmo a propaganda dos dispositivos.

Mas, afinal, como explicar o uso crescente dele? Essa responsabilidade recai ao comércio informal, de modo que os vapes foram muito vendidos ilegalmente pela internet. Além disso, existia a possibilidade de adquirir no exterior.

Dessa forma, em 2019, cerca de 0,6% da população fazia uso do cigarro eletrônico. A grande mudança ocorreu recentemente, no início de setembro de 2022, quando foi proibida a venda do produto em território comercial.

Essa determinação ocorreu no dia 1 de setembro, sendo que o prazo para retirada de circulação seria até o dia 3 do mesmo mês. Portanto, é preciso avaliar com o tempo o quanto essa medida está sendo, de fato, cumprida e efetiva no combate ao cigarro eletrônico.

Descubra os principais malefícios

Embora a legislação carregue um pouco de polêmica, uma das questões mais problemáticas são os malefícios que os dispositivos provocam. Você vai perceber que é algo além da saúde, de modo que até o meio ambiente é prejudicado.

1. Risco para cigarros convencionais

Muito se fala que os cigarros eletrônicos contribuem para afastar a população dos cigarros convencionais. Porém, as estatísticas mostram justamente o contrário: os dispositivos eletrônicos aumentam em três vezes o risco de uma pessoa experimentar o convencional.

Além do risco de experimentar, existe quatro vezes mais chance de continuar com o uso do outro cigarro. Isso porque a nicotina gera dependência e, ainda que não contenha a substância, o hábito em si tende a ser perpetuado.

Neste caso, os movimentos de mão-boca, a inalação e expiração são comuns para ambos os cigarros. Em suma, os vapes vão sustentar a busca por nicotina em outros produtos e, consequentemente, desacelerar a queda de fumantes.

2. Acometimentos pulmonares gerais

Assim como acontece com os cigarros convencionais, os eletrônicos vão gerar acometimentos pulmonares. Isso porque apresentam efeitos pró-inflamatórios, seja nas vias aéreas, seja no parênquima pulmonar.

Dessa forma, o epitélio fica mais friável, além de edemaciado e com maior resistência. Complementado, os cigarros eletrônicos vão gerar a deposição de partículas ultrafinas de metais pesados.

Em resposta, os macrófagos tentam fagocitar e degradar os vapores inalados. Contudo, existe uma diminuição da depuração celular. Por conseguinte, a imunidade inata fica reduzida e piora a resposta às infecções. Tudo isso provoca um grande desequilíbrio imunológico.

3. EVALI

A chamada EVALI é uma sigla que significa: E-cigarette Vaping Associated Lung Injury, em português: lesão pulmonar induzida pelo cigarro eletrônico. Portanto, é uma doença totalmente associada ao uso de cigarro eletrônico. Ela foi descrita pela primeira vez em 2019 e é caracterizada por sintomas que vão além dos pulmões.

De fato, a hipoxemia associada a infiltrados bilaterais descreve muito bem a condição. Porém, existem sintomas constitucionais e gastrointestinais relacionados. É importante ressaltar que é mais comum no sexo masculino e em usuários de tetrahidrocanabinol (THC).

Na primeira série de casos, percebeu-se que 95% dos doentes precisaram de internação hospitalar. A fisiopatologia está relacionada a um acometimento do surfactante, o que resulta em uma tensão superficial inadequada.

O diagnóstico da EVALI é de exclusão. Geralmente, existe história de consumo de vape nos últimos 90 dias. Já o tratamento consiste, basicamente, em suporte clínico e suspensão do uso de cigarro eletrônico.

4. Exposição a partículas

Como visto, existe uma série de partículas que compõem o dispositivo. As nanopartículas de metal, do próprio equipamento, podem trazer prejuízos, como a deposição nas estruturas pulmonares e de vias aéreas.

Além disso, muitas das substâncias utilizadas são carcinógenas. Lembre-se que o aquecimento delas para a vaporização vai gerar reações e modificações químicas que as transformam em partículas tóxicas para o organismo.

Tal exposição vai resultar não só em doenças pulmonares, mas também em acometimentos cardiovasculares.

5. Tabagismo passivo

Já o tabagismo passivo é um grande problema dividido pelos cigarros tradicionais e também pelos eletrônicos. Quando uma pessoa inalar o vapor produzido, mesmo que não seja ela fazendo o uso direto do dispositivo, vai haver um grau de acometimento.

Outro grande problema é a dificuldade em quantificar ou estimar qual o nível seguro de exposição do fumante passivo. Portanto, a única maneira de proteger essa pessoa é combatendo diretamente o tabagismo.

Existem algumas leis que buscam garantir essa proteção. Uma delas é a proibição de fumar em locais fechados. Dessa forma, minimiza os riscos para fumantes passivos, mas deve ser devidamente fiscalizado o cumprimento da norma.

6. Intoxicação por cartuchos ou refis

Agora, vamos para um dos malefícios pouco comentados, mas que pode ser fatal para quem vivencia o problema: a intoxicação por cartuchos. Lembra que a nicotina pode ser encontrada em cartucho ou refis?

Neste caso, existem alguns riscos:

  • ingestão acidental;
  • absorção pela mucosa oral;
  • contato com a pele.

Observe, portanto, que qualquer pessoa está sujeita ao risco. No caso de crianças, por exemplo, sempre existe a preocupação quanto à ingestão de produtos tóxicos. Já para os adultos, o risco é o mesmo, uma vez que pode ocorrer a quebra do frasco ou vazamento da substância.

7. Impactos ambientais

Por último, vamos para um problema que raramente é lembrado: os impactos ambientais. Além de ser um dispositivo eletrônico, não podemos esquecer que ele contém uma série de substâncias potencialmente cancerígenas.

Seja no descarte dos cartuchos, seja por vazamentos acidentais ou mesmo quebra… tudo isso pode prejudicar o meio ambiente. Além disso, existe um grande risco relacionado com incêndios e explosões, principalmente após um descarte inadequado.

Vale ressaltar, neste momento, que o risco de explosões não é apenas após o descarte. Mesmo no dia a dia, ainda durante o uso, pode ser que o acidente aconteça e, novamente, o usuário pode ter a saúde acometida.

Saiba como orientar os pacientes

Vimos, então, alguns malefícios do cigarro eletrônico ou associados ao seu uso. Porém, vale lembrar que o tabagismo está relacionado a diversas condições, sendo ele um dos principais fatores de risco evitáveis. Assim, carrega a responsabilidade de mortes, doenças e custos para o sistema de saúde.

Nessa perspectiva, cabe ao profissional saber detectar o problema e, principalmente, orientar os pacientes sobre os riscos associados e combater o hábito, deixando claro que o uso de cigarro eletrônico faz mal. Veja, abaixo, algumas maneiras de colocar isso em prática.

1. Educar a população

Nos últimos anos, houve uma democratização ao acesso à informação, de modo que muitas delas podem ser obtidas por meio da internet. Porém, um fácil acesso não garante a qualidade delas, ou seja, deve-se tomar muito cuidado com aquilo que se consome.

Por isso, quando o assunto é saúde, os profissionais devem prezar pela educação dos pacientes. Assim, é preciso transmitir as informações de maneira clara, completa e confiável, mas sempre respeitando a decisão final do paciente, que é livre.

Vale ressaltar que um dos grupos focais de atuação são crianças e adolescentes. Isso porque existe uma grande preocupação em evitar a experimentação. Lembre-se que o uso de cigarro eletrônico aumenta consideravelmente o risco para o consumo do convencional.

2. Criação de campanhas

Uma das maneiras de fazer educação em saúde é apostar nas campanhas. Ao longo do ano, vemos que existem diversas mobilizações para conscientização da população sobre determinado assunto, como é o caso do Setembro Amarelo e do Outubro Rosa.

Quando o assunto é tabaco, é preciso informar as pessoas acerca do risco de doenças a longo prazo. É necessário alertar sobre o papel que o tabagismo representa como fator de risco, ou seja, é uma importante causa evitável de morbimortalidade.

Em 1987, foi criado o Dia Mundial sem Tabaco e no ano de 2021, o tema dessa campanha foi “Comprometa-se a parar de fumar durante a pandemia de Covid-19”. Lembre-se que nos fumantes o coronavírus resultava em formas mais graves da doença.

Por fim, as políticas públicas de saúde também podem se voltar para a fiscalização das vendas. Atualmente, já é proibida a comercialização no Brasil. Já na Nova Zelândia, em 2021, avaliava-se uma lei que proibisse a venda de cigarros para a próxima geração.

3. Avaliação de uso

Nem sempre é fácil para o fumante reconhecer o problema que tem. Por isso, é importante que o profissional da saúde saiba avaliar corretamente o uso, levando o paciente a refletir a frequência do consumo, se é algo eventual ou contínuo, e qual a tolerância para abstinência.

Pessoas que fazem o uso do vape logo quando acordam, por exemplo, retratam uma situação mais grave do que uso esporádico. Seja como for a prática, é fundamental que o médico encare a pessoa como um dependente químico que precisa de ajuda.

Sendo assim, sem maiores julgamentos, é preciso oferecer recurso para que a cessação ocorra sem maiores problemas. Primeiro, é preciso definir o “Dia D”, ou seja, o dia para interromper o hábito. Na sequência, é preciso compreender bem as possíveis dificuldades.

Os primeiros dias são mais difíceis, já que o organismo precisa encarar a abstinência das substâncias. Com o tempo, os sintomas físicos e psicológicos tendem a melhorar e, caso isso não aconteça, existe medicação disponível para aliviar.

Vimos, então, que o cigarro eletrônico faz mal não só para a saúde, mas também para o meio ambiente. Embora os prejuízos do tabagismo sejam muito bem estabelecidos, não é fácil determinar com tanta precisão quais são os efeitos crônicos do uso de vapes.

Contribua para a conscientização sobre o cigarro eletrônico

Isso porque o uso é relativamente recente, ou seja, a cada ano vamos descobrir como ele está acometendo a saúde da população. No mais, busque sempre orientar sobre os risco de experimentação e uso do produto.

Sendo assim, compartilhe nosso texto em suas redes sociais e ajude a informar a população!

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