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8.11.2024
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Equipe Afya Educação Médica
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Nas últimas décadas, o progresso da Medicina personalizada tem proporcionado um conhecimento mais profundo sobre os mecanismos subjacentes da doença. Assim, a disseminação de informações mais detalhadas possibilita compreender a importância de individualizar os atendimentos e de utilizar alvos terapêuticos mais específicos.
Em vista disso, vamos abordar as últimas tendências e previsões para a personalização da Medicina. Veja quais são as principais mudanças dos perfis de pacientes e a necessidade de customizar atendimentos, diagnósticos e tratamentos na atualidade. Aproveite a leitura!
A personalização da Medicina envolve uma representatividade que a insere em um conceito cada vez mais amplo. Como parte da rotina médica, é comum a percepção de que pacientes com sintomas semelhantes podem, sim, ter doenças distintas e oriundas de causas diversas.
De igual modo, o mesmo tipo de tratamento pode proporcionar bons resultados terapêuticos em determinados pacientes diagnosticados com a mesma doença. Mas, às vezes, não se consegue o mesmo efeito em outros que, aparentemente, têm o mesmo quadro.
Contextualmente, pode-se afirmar que o pilar da Medicina personalizada está atrelado ao reconhecimento de que diferentes grupos de indivíduos têm características genômicas específicas. Por isso, o ideal é optar por tratamentos que considerem tais diferenças.
No entanto, não há consenso entre os profissionais sobre uma definição exata do que seria a Medicina personalizada. Mas é possível destacar a importância da customização do tratamento médico, tendo em vista a adoção de condutas focadas nas características individuais de cada paciente.
Por convenção, a maioria dos médicos adeptos às práticas inerentes à personalização da Medicina incluíram alguns conceitos relevantes ao tema. Assim, personalizar significa inserir os 4 Ps necessários para que a rotina clínica coloque o paciente no centro do cuidado.
Ou seja, fazer uma Medicina que seja preditiva, preventiva, personalizada e participativa é uma forma de priorizar as necessidades individuais de cada paciente. Focar o atendimento em práticas personalizadas e associadas à Medicina Integrativa pode ser o caminho para tornar o atendimento mais qualificado e eficaz.
Entre os 4 Ps que se destacam como premissas da personalização da Medicina, um deles está diretamente relacionado ao paciente. O "P" de “participativa” prevê que a contribuição dele precisa ser mais ativa na busca pelo sucesso do tratamento. A proposta é que haja mais incentivo para que ele participe, mais ativamente, das decisões que envolvem a sua jornada.
Em vias gerais, isso envolve tanto as práticas de cuidados de prevenção quanto o processo terapêutico. Por isso, é necessário incentivar mais autonomia, o que pode gerar muito mais benefício para a experiência do paciente, além de otimizar os tratamentos.
Os médicos e outros profissionais de saúde devem estimular as pessoas para que elas estejam mais atentas à própria saúde. Nesse sentido, pode-se considerar medidas de educação preventiva como um provável caminho para inserir o paciente no foco no cuidado.
Quanto mais educação, maiores serão as chances de uma pessoa ter mais saúde. Além disso, o trabalho focado na prevenção da saúde contribui diretamente para a redução da demanda do sistema de saúde e, por conseguinte, da diminuição dos custos e dos riscos de sobrecarregar os serviços.
Portanto, o conceito de Medicina personalizada também está relacionado a ações que promovam o empoderamento dos pacientes, sobretudo a partir do conhecimento. Esse pode ser um provável caminho para que tenham mais autonomia e autocuidado.
Desde 2003, quando divulgaram as primeiras informações sobre o mapeamento do genoma humano, a Medicina vem tomando novos rumos. Hoje, existe maior prioridade em ações que cultivem um caráter mais preditivo e preventivo. Essa revolução dos conceitos e práticas foi, gradativamente, alavancada pelas inovações tecnológicas, como a inteligência artificial.
Tais mudanças proporcionaram novas possibilidades, sobretudo quanto ao incentivo de práticas de educação preventiva para os pacientes. Atualmente, os pacientes podem buscar atendimento não apenas para tratar uma doença, mas para preveni-la.
Esse recurso se tornou possível a partir da maior disponibilidade de informações moleculares. Tais dados possibilitam a identificação do surgimento de patologias no futuro, conforme a bagagem genética do paciente.
O sequenciamento do genoma humano ocorreu há cerca de dez anos. Desde então, o foco da comunidade científica está voltado para os efeitos desses dados sobre a prática clínica. As tecnologias que possibilitaram o primeiro sequenciamento continuam evoluindo tanto ao ponto de tornar praticamente possível o sequenciamento genômico humano individualizado e acessível.
Mas sobre essa informação pairam grandes questões: como a Medicina transforma esse conhecimento obtido pela engenharia genética em ações concretas? Como fazer com que as informações contidas no DNA sejam uma ferramenta útil para a prevenção e tratamento de doenças?
Em geral, as pessoas têm, sim, necessidades diferentes. Muito embora, certas doenças causem uma sintomatologia semelhante. Por isso, convém promover o conhecimento das práticas atreladas à personalização dos tratamentos.
Considere a hipótese de dois pacientes diabéticos com a doença descontrolada. Um nega a doença e o outro não. Embora ambos apresentem o mesmo quadro, o plano de cuidado precisa levar em conta as particularidades individuais. Ou seja, mesmo que seja uma doença de fácil manejo, o profissional pode ter dificuldade para interagir com pacientes em fase de negação.
Com esse exemplo, você, médico recém-formado, pode entender melhor como é a lógica da personalização na prática. Na verdade, os melhores resultados terapêuticos são aqueles que propõem tratamento adequado para a pessoa certa e no tempo hábil.
Na prática clínica, os médicos estão acostumados ao uso de incontáveis protocolos, todos baseados em plano padrão e em ensaios clínicos, não é mesmo? Mas não se pode ignorar a relevância de adequar planos de tratamento conforme a individualidade de cada paciente.
Porém, para oferecer essa individualização é fundamental ter uma boa relação médico-paciente. Nesse processo, a manutenção de um diálogo aberto e em linguagem acessível é a chave para obter dados confiáveis, gerenciáveis e passíveis de oferecer um tratamento personalizado.
Sem dúvida, a emergência do paradigma que sustenta os pilares da Medicina personalizada em saúde está atrelada aos recentes avanços da ciência e da tecnologia. Nesse contexto, as áreas mais exploradas são:
Na área de biologia, o sequenciamento do DNA tem ampliado as possibilidades de terapias inovadoras. Com o crescente desenvolvimento da Biologia Molecular, outros nichos se expandiram e possibilitaram novos campos de pesquisa, como a genômica.
Considerado um grande marco tecnocientífico do século XXI, o Projeto Genoma Humano envolveu um trabalho global de vários especialistas da Medicina e da Genética por longos 13 anos, Por meio de ferramentas tecnológicas, a conclusão foi possível somente depois do investimento de US$1 bilhão.
Com as inovações da Ciência e Nanotecnologia foi possível reduzir os custos e tempo necessário para o sequenciamento do genoma de um indivíduo. Com essa mudança, abre-se a possibilidade de viabilizar, num futuro próximo, o mapeamento do genoma humano dos pacientes na rotina médica.
Por definição, a realização de análises genéticas para testar o tipo de resposta a tratamentos é uma das vantagens da Farmacogenética. Essa estratégia já pode ser empregada em diversos tratamentos em centenas de medicamentos.
Vale destacar que a Farmacogenética foi a base dos estudos para a proposta da personalização da Medicina: hoje, há centenas de medicações mapeadas com base nas informações contidas no DNA. Assim, se no sequenciamento do genoma do paciente houver alguns deles, certamente o efeito do remédio será melhor.
Para exemplificar, na prática, com o uso da estatina, fármaco amplamente empregado para controlar os níveis de colesterol. Alguns pacientes se queixam de dores musculares com o uso de estatina. Há, inclusive, o risco de evolução para comprometimento renal.
Por meio dos recursos de Medicina Personalizada, o paciente pode fazer um teste genético que o informa sobre essa particularidade. Hoje, o valor desse sequenciamento está na faixa de R$2 mil.
Mesmo que o valor do exame ainda não seja totalmente acessível, a verdade é que o custo está reduzindo. Há dez anos, o preço era em torno de R$100 mil. Essa queda no preço resulta de mais pesquisas e do uso de equipamentos e técnicas mais baratas na aplicação dos testes em Medicina.
No campo da Oncologia, a inserção da Medicina personalizada tem feito a diferença na realidade de muitos pacientes. A possibilidade de realização de testes que detectam mutações em pacientes com câncer em estágios avançados já faz parte da rotina de muitos oncologistas.
Além disso, esse avanço tem sido considerável também no manejo de diferentes neoplasias. No câncer de mama, contar com essa possibilidade faz muita diferença no prognóstico.
Nesse campo, as perspectivas são bastante animadoras para os pacientes com esse diagnóstico. O sequenciamento do genoma do tumor permite a identificação de um alvo nas células malignas. Em consequência disso, pode-se desenvolver terapias específicas para destruir as células neoplásicas.
Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), o tumor maligno da mama é um dos mais prevalentes na população brasileira. A projeção do Ministério da Saúde (MS) para o próximo ano é que surjam cerca de 73.610 casos novos.
Nesse contexto, a ampliação do acesso aos recursos da Medicina Personalizada permite mais qualidade na assistência. Isso porque os testes genéticos auxiliam na escolha da quimioterapia ou outra medida terapêutica.
Além do tratamento de câncer de mama, no Brasil tem se empregado mais recursos em pesquisas em doenças crônicas possíveis de tratamento personalizado. Entre elas destacam-se a leucemia mieloide crônica, além de alguns cânceres hematológicos.
Como já descrito, para desfrutar dos benefícios que a Medicina Personalizada oferece é preciso entender que ela resulta de uma combinação de fatores. Um dos aspectos mais relevantes é a possibilidade de utilizar informações genéticas para obtenção de dados sobre as condições de saúde e comportamento humano.
A premissa da personalização do atendimento é básica: é preciso aplicar a lógica de adotar um plano de cuidados individualizado, de acordo com as necessidades e perfis dos pacientes. Igualmente relevante é considerar que, nas tomadas de decisão, a Medicina Personalizada também busca considerar as diferenças de genótipo e fenótipo dos indivíduos.
Essa decisão é, geralmente, discutida e compartilhada tanto com o paciente quanto com a equipe de plantão.
Esse tipo de abordagem também é considerada como um benefício da Medicina personalizada. Ao distinguir, com antecedência, quais pacientes se beneficiariam com o tratamento, evita-se trabalho e custos desnecessários.
Mais do que isso: reduz-se, ainda, a ocorrência de efeitos colaterais do medicamento, principalmente quando não há certeza de ganho terapêutico. Logo, a personalização do tratamento permite que a dose do medicamento seja selecionada conforme as características dos pares genótipo-fenótipo.
Portanto, a Medicina Personalizada possibilita vantagens quanto à análise da variabilidade existente entre os metabolismos do paciente. Dessa forma, o uso da dosagem certa e do remédio adequado favorece o alcance de maior precisão e mais eficácia na assistência terapêutica em toda jornada do paciente.
Na rotina clínica, os avanços das pesquisas em Medicina Personalizada possibilita novas abordagens focadas na melhoria do cuidado e do suporte ao paciente de risco. Tendo em vista o alcance de resultados clínicos mais padronizados, os médicos costumam testar os protocolos de tratamento.
A meta é adaptar as alternativas terapêuticas disponíveis ou buscar novas opções, de acordo com a resposta do organismo do paciente. Isso significa que, antes da Medicina personalizada, era praticamente impossível ter respostas de testes imediatamente após o início do tratamento.
Entretanto, com o advento de novos recursos como análises genéticas, essas respostas surgem previamente. Por meio das ferramentas tecnológicas de análise, pode-se prever quando o organismo metabolizará cada substância.
Logo, o médico tem a possibilidade de escolher o protocolo mais eficiente para aquele paciente desde o início do tratamento. Além das demais vantagens que a personalização representa, ainda é possível a recuperação em menos tempo, o que eleva o grau de satisfação dos pacientes com os serviços.
A Medicina personalizada representa uma revolução nos sistemas de saúde. Isso em caráter global, já que possibilita o uso de inovações em diversos tratamentos.
Além da aplicação de terapias mais eficazes em Oncologia, houve a expansão dos tratamentos também em doenças crônicas, cardiovasculares e em doenças neurodegenerativas. Outro campo que se beneficiou também são as síndromes metabólicas, já que as possibilidades farmacológicas foram ampliadas.
Com isso, também houve mudanças até mesmo no padrão de vagas e oportunidades do mercado de trabalho. O emprego de novas tecnologias avançadas no tratamento do câncer, tais como inteligência artificial, genômica e análise de dados, é notório e crescente. Com isso, elevou-se o salário e a valorização profissional na saúde.
Essa revolução foi possível devido aos resultados obtidos com os recursos da Medicina personalizada. Diferentemente da Medicina tradicional, que oferece tratamento igual a todos os pacientes diagnosticados com a mesma doença, o padrão de conduta propõe a personalização. Com o foco nas particularidades do paciente, os resultados são mais objetivos e rápidos.
Presente em células de alguns tipos de câncer de mama, essa proteína é um importante marcador de diagnósticos em Oncologia. Com as possibilidades de Medicina personalizada, o tratamento pode atacar especificamente essa proteína. Além da eficácia e precisão, o tratamento causa efeitos colaterais menos agressivos.
Assim como acontece nos demais países em desenvolvimento, o uso da Medicina personalizada tem um custo muito elevado. Com a maior divulgação dos benefícios, alguns laboratórios particulares passaram a oferecer opções de sequenciamento genético. Porém, o custo é alto para a maioria da população.
Na busca de maximizar o acesso aos exames personalizados, desde 2013, alguns planos de saúde incluíram exames genéticos em seu rol de serviços. Cerca de 29 tipos de doença foram incluídos na lista de procedimentos, conforme as normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Com isso, os exames se tornaram uma alternativa viável para os usuários que são beneficiários dos convênios de saúde. Apesar desse acordo com a Anvisa, a pouca acessibilidade a esses serviços ainda se mantém como um grande desafio para o avanço da Medicina personalizada no Brasil.
Logo, a meta da Saúde Pública é fomentar uma cultura que torne essas práticas mais acessíveis à população. Mesmo que a tecnologia nos mostre o remédio adequado para um paciente específico, é preciso divulgar essa possibilidade e buscar parcerias que reduzam o seu custo.
No Brasil, a pesquisa em genômica populacional teve seu início há algumas décadas. Entretanto, apenas recentemente ela começou a se expandir. Entre outras razões, isso influenciou a diminuição dos custos de análises sobre a variação genética. Os maiores investimentos em estudos de maior porte centrado no sequenciamento do genoma permitiu o conhecimento das variações genéticas mais comuns.
Em 2014, o Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL), do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (ICB-USP), iniciou um projeto de pesquisa nesse ramo. O objetivo era a construção de um banco de dados genômico de brasileiros idosos.
A proposta do ICB é montar uma planilha de referência de controles para estudos genômicos. A base para a elaboração do material considerou uma ampla revisão de literatura, trabalho de campo e estudos sobre as ancestralidades presentes em nossa população.
Nesse estudo, o público-alvo foi o de idosos. A escolha se justifica porque, em sua maioria, esse grupo já passou da idade em que as doenças genéticas se manifestam. Além disso, eles também são mais propensos a comorbidades comuns da vida adulta, tais como doenças osteoarticulares, diabetes e hipertensão.
Independentemente do fator idade, raça e gênero, muitas enfermidades estão relacionadas a fatores como predisposição genética. Como parte de um processo de valorização de medidas preventivas mais eficazes, a Medicina personalizada permite a realização de sequenciamento do genoma. A meta é descobrir as chances reais de desenvolver certas enfermidades.
Por meio dessa estratégia, os pacientes podem ir muito além de uma análise de histórico familiar ou exames de rotina. Com a possibilidade de análise genética e do perfil de risco individual, é possível adotar alternativas reais de prevenção e atingir uma longevidade mais saudável.
Um dos casos mais midiáticos — envolvendo essa temática — ocorreu com a atriz americana Angelina Jolie. Após a submissão a exames de análise genética, ela descobriu que em seu genoma havia uma mutação. O gene mutado expressava um marcador tumoral característico da neoplasia mamária.
Ou seja, a atriz teria 85% de possibilidade de desenvolver um câncer de mama no futuro. Outro aspecto que lhe conferia fator de risco era que a mãe dela havia falecido exatamente em consequência desse tipo de tumor.
Com essa informação em mãos, Angelina Jolie recorreu ao tratamento prévio para minimizar o risco de tumor. Assim, antes que as células malignas surgissem, ela optou pela mastectomia dupla. Por conseguinte, essa intervenção diminuiu as chances de desenvolvimento de tumor mamário para 5%.
Com as possibilidades que a Medicina personalizada representa, os exames genéticos possibilitam a descoberta do índice de risco de inúmeras doenças associadas a fatores hereditários. Perdas funcionais resultantes do Parkinson, Alzheimer, de doenças dermatológicas ou de problemas metabólicos decorrentes do diabetes ou de dislipidemias podem ser previstos e evitados.
Hoje, o que estamos vivenciando é uma mudança de paradigma em áreas médicas de grande importância clínica e epidemiológica. Assim, a proposta da Medicina personalizada é oferecer assistência médica considerando a individualidade física e a carga genética dos pacientes.
Por meio das informações contidas na constituição genômica dos indivíduos, pode-se propiciar uma intervenção terapêutica específica e mais eficaz do que a que é realizada pelos moldes tradicionais. Nos próximos anos, a tendência é que esses procedimentos sejam cada vez mais divulgados e, por conseguinte, mais acessíveis à população.
Infere-se, portanto, que o desenvolvimento da Medicina personalizada trouxe mudanças relevantes nos modelos de atendimento médico. Por meio da análise genética do paciente, os médicos podem identificar, prevenir e minimizar os impactos das doenças que mais desafiam o bem-estar e a qualidade de vida da população.
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