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Hipotireoidismo e gestação: o que é importante saber?

Hipotireoidismo e gestação: o que é importante saber?

O hipotireoidismo pode ocorrer em cerca de 4% das gestações e o hipertireoidismo em até 2,4%. Saiba mais neste artigo da PEBMED.

Hoje vamos abordar um tema muito frequente e capaz de gerar dúvidas até mesmo nos especialistas, que é o manejo das alterações tireoidianas na gestação. O hipotireoidismo pode ocorrer em cerca de 4% das gestações e o hipertireoidismo em até 2,4% quando consideramos overt (estabelecido) e subclínico em conjunto. Além disso, a incidência de câncer de tireoide e nódulos tireoidianos vem aumentando, sendo comum a necessidade de manejar tais condições durante a gestação.  

Em janeiro de 2022 foi publicada uma revisão atualizada e de alta qualidade na Nature Endocrine Reviews a respeito do tema. Por fins didáticos, dividimos o tema entre hipotireoidismo e hipotireoidismo subclínico (tema de dúvidas frequentes) e abordaremos num próximo texto o hipertireoidismo, nódulos tireoidianos e câncer de tireoide nesse contexto.

Os hormônios tireoidianos na gestação

Resumindo a fisiologia, no início da gestação o aumento do beta HCG, que possui um efeito tireotrófico, leva a um aumento na produção de T4, que leva a uma redução transitória no TSH. Por tal motivo, os valores de referência de TSH na gestação devem ser reduzidos quando comparados à população geral.

Quando valores de referência estabelecidos especificamente para uma população e etnia específicos não estão disponíveis, é recomendado utilizar como valor de referência um TSH entre 0,1 a 4,0 mUI/l ou então subtrair 0,4 do limite inferior do kit, no primeiro trimestre.  

Existe ainda um efeito do estrógeno, aumentando a produção da TBG, que por sua vez eleva a quantidade de T4 total, afetando o equilíbrio com o T4 livre. Por esse motivo, o T4 livre é um exame menos acurado na gestação quando realizado por imunoensaio (o método de longe mais corriqueiro na prática), sobretudo no segundo e terceiro trimestre, podendo vir “falsamente baixo”. É possível utilizar dosagens de T4 total para seguimento conjunto nesse caso (lembrando que entre a 7ª e 16ª semana há um aumento em cerca de 5% do T4 total devido o aumento da TBG.

A partir da 16ª semana, devemos considerar um incremento de 150% no limite superior do T4 total como valor de referência).

 

Hipotireodismo

A tireoide fetal começa sua produção hormonal própria a partir de dez a doze semanas, mas se torna madura e suficiente a partir da 20ª. Até lá, o feto depende dos hormônios tireoidianos maternos. Logo, a deficiência materna nesse período pode gerar consequências, sobretudo no desenvolvimento neurocognitivo, além de consequências obstétricas e perinatais como maior risco de prematuridade, baixo peso ao nascer, pré-eclâmpsia, diabetes gestacional e parto cesárea.

 

Hipotireoidismo subclínico e hipotiroxinemia

O hipotireoidismo subclínico é definido por um TSH acima do valor de referência, com um T4 livre normal. É um tema um pouco controverso e com dados conflitantes na literatura. Os dados mais relevantes comumente apontam maior risco de prematuridade e abortamentos. Uma metanálise de 2019 que avaliou 19 estudos de coorte mostrou, por exemplo, maior risco de prematuridade em mulheres com hipotireoidismo subclínico. (OR 2,9; IC 95%; 1,01 – 1,64). O risco tende a ser maior quando o Anti TPO é positivo, o que é fundamental saber para definição de tratamento.

Dados também observacionais apontam para um maior risco de impacto no desenvolvimento cerebral.  

Uma metanálise de 2018 de 26 estudos observacionais apontou maior risco de QI baixo, atraso de linguagem ou de desenvolvimento global (OR 2,14, IC 95%, IC 1,2 – 3,83) em gestantes com hipotireoidismo subclínico.  

Já a hipotiroxinemia é uma situação encontrada na gestação onde o TSH está dentro dos valores de referência e o T4 livre abaixo. Esta condição também é muito controversa, sendo que até o momento não há dados que suportem o tratamento desta condição isolada.

 

Recomendações de tratamento

Quanto ao hipotireoidismo estabelecido (overt), não há dúvidas: existe a recomendação de tratamento com levotiroxina. Importante destacar que não há espaço para o uso de T3 na gestação e que existe em geral um aumento na necessidade de hormônios tireoidianos de cerca de 20 a 30% no início da gestação. O alvo de TSH na gestação é < 2,5 mU/l.  

O maior problema está aqui: encontrar evidências de qualidade que suportem o tratamento do hipotireoidismo subclínico. A grande maioria dos estudos, quando leva em conta pacientes com TSH entre 2,5 e 10 mU/l não mostra grandes impactos em termos de melhora cognitiva ou redução no risco de prematuridade.

Contudo, a crítica de boa parte desses estudos é que eles são realizados introduzindo a levotiroxina de forma tardia, e não logo no início da gestação. Este ainda é um tópico sem uma resposta muito clara e sem um posicionamento estabelecido nesta revisão.

 

*Observação: As recomendações do consenso da ATA (American Tyroid Association), 2017, em termos práticos sobre o hipotireoidismo subclínico:

 

Tratar quando:

 

TSH > 10 mU/l

Se anti TPO positivo: TSH > 4 mU/l

Considerar tratamento (menor nível de evidência, discutível):

 

Se TSH entre 4 e 10 mU/l e anti TPO negativo ou

Anti TPO positivo e TSH entre 2,5 e 4,0 mU/l

 

Conclusão

A dosagem do TSH deve fazer parte da avaliação rotineira do pré-natal em mulheres acima de 30 anos, com antecedentes de doenças tireoidianas ou anti TPO positivo, radiação cervical, doenças autoimunes, DM1 prévio, IMC > 40 kg/m², uso recente de amiodarona, lítio ou contraste e naquelas que estejam sintomáticas. Na prática, é muito comum a dosagem dos hormônios tireoidianos de forma generalizada; o cuidado que devemos ter nessa situação é a interpretação adequada para não se precipitar e indicar um tratamento para uma condição fisiológica (por exemplo, confundir um hipertireoidismo com a redução do TSH esperada no primeiro trimestre), mas também não hesitar em tratar quando houver a indicação.

É sempre ideal ter um seguimento com especialista quando houver dúvidas. No próximo texto discutiremos a respeito das atualizações no hipertireoidismo e nódulos tireoidianos na gestação.

Autor

Luiz Fernando Fonseca Vieira

Médico Residente (R4) em Endocrinologia (HCFMUSP) ⦁ Telemedicina no Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE) ⦁ Residência médica em Clínica médica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) ⦁ Graduação em Medicina pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) - Faculdade de Medicina de Botucatu ⦁ Instagram: @luiz_ffvieira

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