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É possível preparar-se para lidar com a morte de um paciente?

É possível preparar-se para lidar com a morte de um paciente?

Muitos médicos têm dificuldades em lidar com a morte de um paciente. A sensação de impotência pode surgir, assim como as dúvidas constantes: foi feito tudo que estava à disposição? Algo diferente poderia ter salvo a vida do paciente?

Não há convívio ou rotina que dessensibilize nenhuma pessoa para a morte, algo tão intrínseco à vida humana, mas sempre de difícil aceitação.

Quando circula uma notícia que demonstra a emoção do médico diante dessa situação, há quem pense que talvez seja um profissional recém-formado, sem muita experiência. Mas a verdade é que, mesmo depois de décadas de profissão, é normal que o profissional ainda tenha dificuldades em aceitar a perda de um paciente.

Por outro lado, a formação superior tradicional também não prepara o médico para a perda. A luta pela vida de um paciente se coloca como uma corrida ou um desafio — e a derrota caracterizada pela morte nunca é bem-vinda.

Mas, nesse contexto, como lidar com a morte de um paciente? Confira o post de hoje, que trata exatamente desse tema.

Os sentimentos do médico sobre a morte de um paciente

Um médico prima pela vida; em todos os aspectos de sua profissão, as atitudes e decisões que toma prezam pela continuidade da saúde do paciente. Por isso, lidar com a morte é como se ver derrotado: significa dizer que você perdeu a luta de uma forma irrevogável.

E não apenas a sensação de perda dessa batalha traz desconforto ao médico. Muitos buscam não se aproximar demais do paciente, para não criar vínculos emocionais, especialmente quando os indícios de terminalidade são patentes.

Há quem pense que o tempo torna o médico insensível a esse trágico momento, o que não é verdade. A morte, apesar de uma certeza, é sempre motivo de luto — e o médico não está isento disso. Mesmo aqueles que possuem décadas de profissão relatam a dificuldade em lidar com a questão.

Quando o paciente é alguém cuja morte é inesperada, a situação piora. Pessoas com uma doença crônica e incurável dão aos familiares tempo suficiente para preparar-se para o momento da passagem.

O mesmo acontece com os médicos: é mais fácil se conformar com a perda de alguém cuja morte já se pronunciava do que com a de um jovem, com uma vida inteira cheia de sonhos, que não se concretizará.

Assim, o médico também passa, à sua forma, pelo luto. Eventualmente, cabe a ele comunicar a morte à família do paciente — o que torna a situação ainda mais delicada de encarar. E, como atende várias pessoas simultaneamente, é comum que opte por guardar certa distância, para que a questão não afete seu julgamento e a qualidade do seu atendimento para com todos os outros pacientes.

A questão delicada de comunicar a morte à família

Dificilmente a família e os amigos próximos estão preparados para a situação. O choro e o desespero são reações comuns diante da notícia da perda, que geralmente é dada pelo médico.

Na maioria dos hospitais, um outro profissional — como uma telefonista, por exemplo — liga para os familiares e pede comparecimento ao hospital, sem dar maiores detalhes. A notícia, via de regra, é dada apenas pessoalmente.

Assim, o médico tem que lidar com reações das mais diversas; geralmente, é ele que precisa se disponibilizar para dar suporte ao momento, fortalecendo aqueles que precisam assimilar sua dor. Falar que "foi melhor assim" ou "tinha mesmo que acontecer" não é algo que caiba, mesmo diante de situações de terminalidade. Ninguém quer aceitar que foi melhor perder o ente querido para a morte.

Dessa forma, cabe ao médico prestar apoio emocional, perguntar se há mais alguém da família presente ou mesmo verificar se o familiar tem necessidade de algum atendimento médico ou psicológico.

Nesse momento, seus questionamentos internos podem permanecer fervilhando, mas ele não deixa isso transparecer. A sensação de que poderia ter feito algo em favor do prolongamento da vida do paciente não é algo que esteja aberto à discussão, especialmente com a família. Mas, inegavelmente, essas ponderações inquietam o profissional.

A importância de dar a opção dos cuidados paliativos

Há uma questão preponderante que pode dar ao médico um conforto maior, assim como ao paciente e seus familiares: os cuidados paliativos. A frase do professor Jurgen Moltmann explicita bem essa questão: "O Homem tem direito à morte como tem direito à vida. Morrer é um processo humanamente tão importante quanto nascer e viver."

É preciso que o médico saiba quais as melhores armas a utilizar em sua batalha pela vida. Quando não há chances de cura, é imprescindível oferecer ao paciente as melhores condições para seus momentos finais. E é importante se preparar para isso, independentemente da carreira que você escolher dentro da medicina.

Nos seus últimos dias de vida, o paciente pode continuar sendo atormentado pela dor e pelo incômodo. Entretanto, esse tempo precioso pode ser utilizado para o seu preparo e o de sua família, incluindo aí as questões sentimentais, psicológicas e burocráticas.

O simples ato de ministrar remédios para a dor e não priorizar procedimentos invasivos que vão apenas dar uma sobrevida cheia de sofrimento é uma atitude de quem preza pela dignidade da vida, mesmo no momento da morte. E isso vale para questões mais banais, como não interromper o sono do paciente batendo em sua porta para ministrar medicamentos ou acendendo luzes diretas sobre ele.

Para além disso, é preciso encarar e dar como opção ao próprio doente terminal e à família o direto à ortotanásia, que é o encerramento dos tratamentos para prolongamento da vida. O médico deve abrir-se e expor aos familiares a questão: um paciente que depende de aparelhos para manutenção de suas funções vitais está, de fato, vivendo?

A prática já é autorizada no Brasil desde 2006 e pode mudar a forma de médicos, pacientes e familiares encararem esse momento, mudando o foco da dor e do sofrimento para entender a morte como algo natural, intrínseco à vida, ajudando a mitigar o sofrimento do doente terminal em seus últimos dias.

Quando a ortotanásia é uma possibilidade descartada e o paciente é submetido a um prologamento indevido da sua condição e do seu sofrimento, configura-se a diastanásia. Lutar pela permanência desse estado  pode vir a prolongar a angústia de todos, principalmente do paciente e também do próprio profissional.

O médico precisa, enfim, ter a humildade de lidar com a perda de sua batalha em favor da vida e tornar o momento o menos traumático possível para todos os envolvidos — incluindo ele mesmo.

A formação médica para lidar com a morte de paciente

Não há nos cursos de formação superior disciplinas ou outro tipo de abordagem que prepare o médico para lidar com a perda de um paciente. É importante que ele busque referências a mais, como uma pós-graduação ou um curso de prática clínica que aborde a ética e a terminalidade. Assim, ele se fortalece para saber como agir diante da morte de um paciente — em relação a seus sentimentos consigo mesmo e à família.

Além disso, vale a pena buscar acompanhamento psicológico constante e, sobretudo, após uma ocorrência do tipo. O equilíbrio do médico influencia diretamente em sua capacidade de escolha e na tomada de decisão em relação a seus outros pacientes.

Outra alternativa é conversar com médicos mais experientes e, quem sabe, formar grupos para tratar sobre o tema. Isso é uma prática eficiente para manter o equilíbrio psicológico de profissionais intensivistas ou que atuam em áreas como geriatria, oncologia ou com emergências.

De toda forma, não adianta suprimir seus sentimentos e apenas buscar impessoalidade no trato com a família e com o próprio doente que está na iminência de morte. Isso só prejudica o sucesso profissional do médico, que pode passar a impressão de não se importar com seus pacientes.

Segundo pesquisadores, "a manutenção da integridade da relação médico-paciente, principalmente nos casos em que há morte e sofrimento, é fortificada quando o profissional privilegia o doente sobre sua doença, minimizando sua dor como um todo e focando o tratamento na pessoa mais do que na doença”.

O melhor é demonstrar empatia, oferecer suporte e sempre prestar atendimento paliativo, cuidando constantemente de sua própria formação humana e de seu estado psicológico íntimo, para não sucumbir emocionalmente frente à morte de um paciente.

Você já presenciou ou teve que lidar com a morte de um paciente ou com alguma circunstância grave? Sabe como se preparar para essas situações? Compartilhe conosco suas experiências e deixe um comentário.